Carta aberta para governantes, gestores e empresarios - pedido de apoio para jovem recém-doutorado com paralisia cerebral
Fernando Lobo - fernando.lobo@gmail.com - http://w3.ualg.pt/~flobo
DEEI-FCT, Universidade do Algarve
Campus de Gambelas
8005-139 Faro
27 de Outubro de 2009
O meu nome é Fernando Lobo e sou professor no Departamento de Engenharia
Electrónica e Informática da Universidade do Algarve. Escrevo esta carta aberta para
sensibilizar a sociedade portuguesa e apelar para que seja dado apoio a um jovem que tem paralisia cerebral e que concluiu o doutoramento na Universidade do Algarve. O jovem chama-se Paulo Condado. A sua tese de doutoramento é intitulada Quebra de Barreiras de Comunicação para Portadores de Paralisia Cerebral e foi defendida no dia 14/Abr/2009.
O Paulo Condado realizou um trabalho brilhante durante o doutoramento, tendo contribuído de forma signicativa para o avanço do estado da arte na àrea das acessibilidades.
Especicamente, desenvolveu um sistema informático denominado de EasyVoice (disponível gratuitamente através do endereço http://w3.ualg.pt/~pcondado/easyvoice/)
que permite que pessoas com deficiências na fala possam efectuar chamadas telefónicas
utilizando uma voz artificial gerada pelo computador. Trata-se do primeiro sistema a
nível mundial que permite a comunicação à distância usando síntese de voz. O trabalho
foi publicado nas mais conceituadas conferências mundiais na àrea de Computers
and Accessibility e foi alvo dos maiores elogios por parte de cientistas de renome internacional.
A título de exemplo, deixo um apontador para um testemunho dado por Jim
Fruchterman a propósito do EasyVoice (ver http://benetech.blogspot.com/2008/07/
austria-conference-on-access-technology.html). O artigo que descreve a essência do EasyVoice foi publicado em 2008 na International Conference on Computers Helping People with Special Needs (ICCHP-2008) e pode ser lido em http://w3.ualg.pt/~pcondado/papers/easyvoice-icchp2008.pdf
A história de vida do Paulo Condado, bem como o trabalho de investigação que realizado no âmbito do doutoramento foi alvo de uma reportagem que passou no Jornal da SIC do dia 27 de Junho de 2007. Um excerto da reportagem pode ser visto na Internet no endereço http://videos.sapo.pt/LrQnBm8lkzyLbvGPyVDP
O sonho do Paulo Condado é poder continuar a fazer investigação na àrea das acessibilidades, contribuindo assim para a melhoria a vida de muitos deficientes. Actualmente o Paulo Condado não tem trabalho. Tenho feito tudo o que está ao meu alcance para ajudá-lo mas atá ao momento não tenho tido sucesso.
Falei com um dos Vice-Reitores da Universidade do Algarve para que fosse criado
um Gabinete de Acessibilidade dentro da Universidade cuja missão seria dar apoio e
aconselhamento aos estudantes com deficiências, bem como aconselhar os professores
em como lidar com esses alunos, indicando tecnologias de acessibilidade apropriadas
a cada caso. O Paulo Condado poderia perfeitamente trabalhar num gabinete desse
tipo, podendo conciliar essas tarefas com trabalho de investigação no campo das
acessibilidades. A resposta que obtive é que a universidade não tem verba.
Escrevi no dia 8/Maio ao Ministro do Trabalho e da Segurança Social, José Vieira da
Silva, pedindo apoio. Sugeri que o Paulo Condado poderia trabalhar para o ministério
como especialista/consultor na àrea das acessibilidades. Nessa mesma data, escrevi
também para o Presidente da UMIC | Agência para a Sociedade do Conhecimento,
pedindo apoio. Em ambos os casos não obtive qualquer resposta.
Escrevi ainda à Fundação Champalimaud há cerca de 1 mês, mas também ainda não
recebi resposta.
Recentemente, soube atravás do jornal Expresso que a Microsoft celebrou
um acordo com a Associação Salvador (http://aeiou.expresso.pt/
windows-7-candidato-a-imperador-a-merce-dos-subditos=f542865), e que
está prevista uma colaboração estreita para promover o desenvolvimento de novas
tecnologias de reconhecimento de fala e síntese de texto. Penso que o Paulo Condado
tem o perfil ideal para trabalhar no âmbito deste projecto. Acabo de contactar quer
a Microsoft, quer a Associação Salvador, para que lhe seja dada uma oportunidade
de trabalho. Espero que desta vez o meu pedido seja bem sucedido.
Custa-me ver um jovem tão talentoso não ter oportunidade de colocar em prática os
elevados conhecimentos técnicos que possui. A única coisa que tenho conseguido arranjar para o Paulo são bolsas esporádicas ao abrigo de projectos de investigação. Tratam-se de bolsas com uma duração limitada e que não lhe garantem o mínimo de segurança para o futuro, sendo apenas uma solução de curto prazo. Para agravar a situação, a mãe do Paulo tem tido problemas de saúde graves. Esta situação vem reforçar a necessidade urgente de proporcionar ao Paulo Condado alguma estabilidade financeira.
Apesar do sonho do Paulo ser fazer uma carreira de investigação na área das acessibilidades, está disposto a trabalhar na área da informática em empresas/instituições (de preferência na região do Algarve onde tem o apoio familiar, mas não excluindo a possibilidade de ir para outros locais do país.) O Paulo Condado domina várias àreas da informática, desde a programação, bases de dados, redes de computadores, desenvolvimento de interfaces.
Poderá encontrar informação adicional sobre o Paulo em http://w3.ualg.pt/~pcondado.
O seu Curriculum Vitae está disponível em http://w3.ualg.pt/~pcondado/vitae-pcondado2009.pdf
A história do Paulo é um exemplo notável. Uma vida de sacrifício, de luta permanente
contra os preconceitos. Conseguiu andar pela primeira vez aos 5 anos. A sua mãe teve
de lutar contra ventos e marés para que o aceitassem no ensino regular. Inicialmente não o queriam aceitar, queriam mandá-lo para uma turma especial com crianças com atraso mental. Mas o Paulo nunca teve atraso mental: teve e tem apenas uma deficiência física que lhe afecta a fala e a coordenação de movimentos. Foi ultrapassando barreiras atrás de barreiras. Ainda em criança apaixonou-se pelos computadores, entusiasmado com as possibilidades que lhe proporcionavam na forma de se expressar e comunicar com o mundo que o rodeava. Conseguiu terminar a licenciatura em Informática e não parou por aí. Com o mesmo entusiasmou dedicou-se à investigação e fez um doutoramento, dando contribuições científicas que beneficiam outras pessoas na mesma condição.
Não sei se haverá mais alguém em Portugal que tenha paralisia cerebral e que tenha
conseguido realizar um doutoramento. Provavelmente é um caso único. Ainda mais nobre
é o facto de ele se ter especializado precisamente no campo das acessibilidades, uma àrea tão sensível na qual Portugal não tem praticamente especialistas doutorados.
Não consigo compreender como é que a Universidade do Algarve não aproveita uma
pessoa com estas qualidades para formar um Gabinete de Acessibilidade. Não consigo
entender também a falta de resposta por parte do Ministério para o Trabalho e Segurança Social, aparentando uma preocupante falta de interesse pelo assunto.
Gostaria de ver Portugal à altura da doutrina que apregoa. Uma doutrina socialista
onde haja protecção para os mais desfavorecidos, sobretudo que proteja aqueles que remam contra a maré e que fazem de tudo para não serem uma sobrecarga para o Estado. Portugal deve não só proteger como também publicitar pessoas como o Paulo, fazendo delas exemplo que possa inspirar outros na mesma situação.
A todos os leitores desta carta, e especialmente aos governantes, gestores e empresários de Portugal, apelo para que seja dado ao Paulo Condado aquilo que ele merece: uma oportunidade de trabalho condigna que potencialize as suas capacidades. Só assim é que outros como ele vão ver que os sacrificios e a perseverança valem a pena.
Grato pela atenção,
Fernando Lobo
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